Plínio Salgado*
Há cento e vinte e dois anos, mais precisamente no
dia 22 de janeiro de 1895, nasceu Plínio Salgado, na pequena, bucólica e
tradicional cidade montanhesa de São Bento do Sapucaí, na Serra da Mantiqueira,
na região paulista do Vale do Paraíba.
Magno e brilhante escritor, jornalista e orador e
profundo, robusto e fecundo pensador e doutrinador político patriótico,
nacionalista e tradicionalista, Plínio Salgado foi, ainda, o criador e
principal líder do grande movimento de renovação moral e social a que denominamos
Integralismo e o arauto e lidador de um Brasil Novo e Maior. O “mais eloquente
intérprete da Brasilidade”, na expressão do ilustre pensador e escritor
tradicionalista português Hipólito Raposo,[1]
Plínio Salgado foi e é, como escreveu, no mesmo sentido, o insigne jusfilósofo
tomista e pensador tradicionalista espanhol Francisco Elías de Tejada y
Spínola, o “profeta incandescente e sublime de seu povo”, a “encarnação viva do
Brasil melhor”,[2] e,
por ter sido o primeiro pensador patrício a efetivamente compreender a Tradição
Brasileira, o “descobridor bandeirante das essências de sua pátria”.[3]
Assim, embora criminosamente olvidado e injustiçado
por muitos e desconhecido pela maior parte do nosso povo, esse valoroso soldado
e condestável de Deus e da Pátria e bandeirante da Fé e do Império terá seu
nome lembrado e evocado por todos aqueles que, sabendo separar o homem e a obra
das falsas acusações de seus inimigos, reconheçam em seus escritos um
inigualável repositório de Fé Cristã e de Brasilidade. Noutras palavras, não
passará sobre a Terra o nome do autor da Vida
de Jesus e de Primeiro, Cristo!,
que, ao contrário, será mais lembrado com o correr dos anos, pois a sua
doutrina tornar-se-á mais atual e necessária para o Brasil a cada dia e suas
previsões ganharão autoridade à medida que mais delas se forem tornando
realidade.
Plínio Salgado, esse nobre “cavaleiro do Brasil
Integral”, no dizer do poeta, romancista, contista, jornalista, diplomata e
ensaísta patrício Ribeiro Couto, veio ao Mundo, como há pouco dissemos, a 22 de
janeiro de 1895, em São Bento do Sapucaí, pequena cidade em estilo colonial
que, ainda nas palavras do autor de Cabocla
e Largo da Matriz, “repousa entre
verdes lavouras, num píncaro de serra, na Mantiqueira”.[4]
Seus pais foram o Coronel Francisco das Chagas Esteves Salgado, farmacêutico e
chefe político da região, e D. Ana Francisca Rennó Cortez, professora
normalista formada em São Paulo, no último ano do Império.
Nas veias de Plínio Salgado comungavam, nas
palavras de Francisco Elías de Tejada, “as variadas genealogias que forjaram a
gente brasileira”.[5] Seu
avô paterno, Manuel Esteves da Costa, era português, nascido em São Pedro do
Sul, distrito de Viseu, e, tendo estudado humanidades em Coimbra, emigrou para
o Império do Brasil por conta da perseguição que sofreu em sua Pátria em
virtude de suas ideias tradicionalistas. Uma vez em nosso País, casou-se, em
Pindamonhangaba, com D. Mariana Salgado Cerqueira César, que viria a ser a avó
paterna de Plínio Salgado e pertencia a uma das mais antigas e tradicionais
famílias da região do Vale do Paraíba, assim como descendia de bandeirantes
como Bartolomeu Bueno, o primeiro “Anhanguera”, e Manuel Preto, o conquistador
de Guairá, retratado por Plínio Salgado, aliás, em seu poema épico em prosa A voz do Oeste (1934), que, com efeito,
inspirou Juscelino Kubitschek, amigo e grande admirador de Plínio Salgado, a
edificar a cidade de Brasília.[6]
Os avós maternos de Plínio Salgado, por sua vez,
foram o Professor Antônio Leite Cortez, natural de Taubaté e descendente de
castelhanos e portugueses, e D. Matilde Sofia Rennó, também professora e filha
do médico alemão Johann Rennow, que adotou, no Brasil, o nome de João Rennó de
França, e de D. Ana Joaquina Ferreira, curitibana que descendia de alguns dos
primeiros habitantes de São Paulo do Campo de Piratininga, dentre os quais
podemos destacar a figura de Pero Dias, guardião das chaves daquela vila quando
de sua fundação.
O Coronel Francisco das Chagas Esteves Salgado,
pai, como há pouco observamos, de Plínio Salgado, era um homem profundamente
patriota e nacionalista na acepção sadia, equilibrada e construtiva do termo e
tinha o costume de reunir os filhos à noite para lhes narrar os feitos de
Felipe Camarão, de Henrique Dias, do General Osório, do Duque de Caxias, dos
almirantes Barroso e Tamandaré e de outros vultos da História Pátria,
incutindo-lhes, assim, desde cedo, o amor ao Brasil e às suas tradições
históricas.
Pouco depois dessas primeiras aulas de patriotismo,
D. Ana Francisca, que já ensinara Plínio a rezar e também lhe incutira o temor
a Deus e lhe narrara histórias bíblicas, começou a dar ao filho lições de
História do Brasil, Geografia, Aritmética e Francês.
No ano de 1907, Plínio, que havia iniciado os
estudos secundários no Externato São José, dirigido pelo Professor José
Calazans Nogueira, seguiu para Pouso Alegre, em Minas Gerais, onde estudou
humanidades no tradicional Ginásio Diocesano São José, em que também estudavam
Menotti Del Picchia, Guilherme de Almeida e Teodoro Quartim Barbosa, com os quais
o então futuro autor de O estrangeiro e
de Espírito da burguesia firmou uma
grande amizade, que se estenderia por toda a vida. Também estudaram no Colégio
Diocesano São José, dentre outros, Dom Idílio José Soares, Bispo de Petrolina
e, depois, de Santos, e Dom Antônio de Almeida Moraes Júnior, Bispo de Montes
Claros e, mais tarde, Arcebispo de Olinda e Recife e, em seguida, de Niterói, e
um dos maiores oradores sacros brasileiros, bem como um dos mais ilustres
adeptos das doutrinas políticas de Plínio Salgado.
O falecimento do pai, no ano de 1911, forçou Plínio
a abandonar os estudos e a retornar a São Bento do Sapucaí a fim de cuidar da
mãe e dos irmãos menores.
D. Ana Francisca, que ainda lecionava em sua escola
isolada para meninas, que funcionava nos fundos de sua residência, transformou
outro cômodo da casa em sala de aula, abrindo uma escola para meninos e
confiando-a a Plínio.
Pouco mais tarde, Plínio principiou a trabalhar
como agrimensor e topógrafo judicial. Em seguida, obteve o cargo de inspetor
escolar no Município e, em virtude de se haver habilitado para requerer em
juízo e promover o andamento dos feitos, foi nomeado solicitador, exercendo a
função de advogado quando não havia advogados.
Por essa época, Plínio Salgado colaborou no jornal A Cidade de São Bento, havendo sido, por
algum tempo, segundo Genésio Cândido Pereira Filho, diretor de tal periódico,
que tinha Couto de Magalhães entre seus colaboradores e encerraria suas
atividades, por problemas financeiros, em 1914.
Em 1913, Plínio Salgado se mudou para São Paulo,
onde planejava concluir o curso secundário, interrompido quando da morte de seu
pai, e, em seguida, ingressar no curso de Direito da tradicional Academia do
Largo de São Francisco. Por conta, porém, da situação de pobreza da família,
agravada com o início da I Guerra Mundial, Plínio abandonou os estudos em 1914,
antes de ingressar na aludida Faculdade, e deixou a Capital Paulista,
retornando a São Bento.
Embora não tendo formação jurídica, Plínio Salgado,
que, conforme salientou Ronaldo Poletti, “associava, como é notório, ao lado de
sólidos conhecimentos em humanidades, uma intuição profunda reveladora de
premonição atinente a fatos e a ideias futuras”, fez, em sua obra, inúmeras
referências ao Direito, ciência da qual cuidou dos pontos de vista teórico e
prático.[7]
Por suas reflexões sobre temas como o Homem, o Estado e a ideia de Império,
podemos dizer que Plínio Salgado, defensor do Direito Natural Tradicional, ou
Clássico, e do Estado Ético de Direito e de Justiça a que denominou Estado
Integral, embora não tendo sido um jurista, foi e é, sem dúvida alguma, um dos
mais notáveis jusfilósofos do Brasil. Cumpre sublinhar que, como enfatizou
Ronaldo Poletti, as ideias jurídicas de Plínio Salgado tiveram um desdobramento
na obra e na ação de diversos juristas patrícios, “cujas formações se deram ou
completaram a partir de um ponto comum”, que vem a ser o pensamento do egrégio
autor de O ritmo da História (1949) e
de Direitos e deveres do Homem
(1948). Dentre tais juristas, destacou Poletti Miguel Reale, San Tiago Dantas,
Alfredo Buzaid, Goffredo Telles Junior e Loureiro Junior,[8]
aos quais poderíamos acrescentar, dentre outros vultos do Direito e das letras
jurídicas, Rubem Nogueira, Arthur Machado Paupério, Ignacio da Silva Telles,
Alberto Cotrim Neto, Ítalo Galli, Oldegar Vieira, Cláudio De Cicco, Marcus
Claudio Acquaviva, Acacio Vaz de Lima Filho e o próprio Poletti.
De volta a São Bento do Sapucaí, sentinela da Terra
Bandeirante que muito se assemelha a um presépio vivo na Serra da Mantiqueira,
como evocou, num inspirado poema, o jornalista, escritor e editor Cláudio de
Cápua,[9]
Plínio Salgado, aproveitando as horas de lazer, leu autores como Spencer,
Comte, Kant, Hegel, Schopenhauer, Nietzsche, Büchner, Haeckel, Lamarck, Gustave
Le Bon, Jhering, William James e Ingenieros, ao mesmo tempo em que se
aprofundava no conhecimento de nossa Literatura, assim como das literaturas
portuguesa, francesa, espanhola, italiana, inglesa, alemã e russa.
Em 1915, foi fundado, em São Bento, o Externato São
Luiz, por Genésio Cândido Pereira, que mais tarde se tornaria o pai do escritor
Genésio Cândido Pereira Filho e também um dos mais proeminentes vultos do
Judiciário Paulista. Plínio Salgado lecionou no Externato São Luiz, instituição
de que foi Secretário, e fundou e redigiu, juntamente com Genésio Cândido
Pereira, o jornal daquele Externato, denominado Alvor.[10]
Ainda em 1915, Plínio Salgado coordenou a
publicação do Almanaque de São Bento
e, no ano seguinte, fundou, com o primo Joaquim Rennó Ferreira, o semanário Correio de São Bento
No ano de 1918, Plínio, que já tivera trabalhos
publicados na Revista do Brasil e no Correio Paulistano, casou-se com Maria
Amélia Pereira, irmã de Genésio Cândido Pereira.
Por esse tempo, era ele a figura central da cidadezinha
de São Bento do Sapucaí, sendo diretor do jornal local e do grupo dramático,
secretário do Tiro de Guerra e do Externato São Luiz, presidente do clube de
futebol, orador do Gabinete de Leitura e agrimensor.
Ainda em 1918, enquanto se convalescia da gripe
espanhola, que o atingira, Plínio leu o livro Farias Brito e a reação espiritualista, de Francisco Teive de
Almeida Magalhães e, em seguida, as obras do próprio Farias Brito e de Jackson
de Figueiredo, abandonando, assim, o materialismo e retornando ao
espiritualismo cristão, ao mesmo tempo em que, preocupado com a questão
nacional, lia também autores como Alberto Torres e Euclides da Cunha.
Conforme fez salientar Francisco Elías de Tejada,
“o que Plínio Salgado levanta desde a sua conversão intelectual em 1918 são
duas colunas solidíssimas: Cristo e o Brasil”, e o que ele nega são “as ideias
estrangeiras que corrompem o Brasil e repelem o reinado social de Jesus
Cristo”, a saber, o liberalismo, a liberal-democracia, os totalitarismos de
todos os tipos, o positivismo e a herança do século XIX. O resultado disto
será, ainda segundo Francisco Elías de Tejada, “o Integralismo como ação, como
volta à Tradição brasileira” e, “por meta intelectual e política, a aproximação
cada vez mais profunda, de Santo Tomás de Aquino”. Existe na obra pliniana,
ainda de acordo com o insigne jusfilósofo castelhano, “uma lógica evidente”, e,
pois, “ano após ano, vão ficando mais claras as suas ideias, quer aperfeiçoando
conceitos, quer estabelecendo mais exatamente as suas posições; mas são
exposições e esclarecimentos conservados sempre em torno daquelas duas
temáticas centrais, de Cristo e da pátria brasileira”.[11]
Em 1919, Plínio perdeu a esposa quinze dias depois
de esta haver dado à luz Maria Amélia, única filha do casal, e teve publicado o
seu primeiro livro, o volume de versos parnasianos Tabor, elogiado pela Revista
do Brasil, cujo proprietário era então Monteiro Lobato, e de que consta o
célebre poema Canção das Águias.
Nesse mesmo ano, Plínio Salgado, que tempos antes
fundara, ao lado do Dr. Gama Rodrigues, o Partido Municipalista, primeira
agremiação política do País a defender o Municipalismo, deixou São Bento do
Sapucaí em virtude de problemas políticos e seguiu para a Capital Paulista.
Em fevereiro de 1922, quando já era redator do Correio Paulistano, Plínio, que antes
disso fora redator do jornal A Gazeta,
participou ativamente da Semana de Arte Moderna, realizada no Teatro Municipal
de São Paulo.
No ano de 1926, publicou O estrangeiro, que é, cronologicamente, o primeiro romance social
em prosa modernista da Literatura Brasileira. Como ressaltaria Menotti Del
Picchia, o romance de estreia de Plínio Salgado “confirmou-se como um marco
renovador do romance brasileiro”, abrindo “a série das grandes obras que, num radioso
renascimento de um sadio nacionalismo, escachoaram do Norte tendo na vanguarda
a já histórica Bagaceira de José
Américo de Almeida”.[12]
Este último escreveu a Plínio, como observou Cláudio de Cápua, uma carta em que
afirmou que depois de haver lido O estrangeiro
considerara esta obra o primeiro romance, em importância, do Modernismo e
resolvera reescrever totalmente o seu livro A
bagaceira, que viria a ser publicado em 1928.[13]
O estrangeiro, maior poema em prosa do
Modernismo Brasileiro,[14]
teve um sucesso verdadeiramente extraordinário. A primeira edição se esgotou em
menos de vinte dias e o burburinho que se fez em torno da obra na imprensa
nacional foi algo realmente notável. Plínio Salgado, porém, ignoraria tudo o
quanto então se publicava a respeito dele e de sua revolucionária obra, não
fosse por seu amigo Fernando Callage, que colecionava todos os artigos, uma vez
que, naquela ocasião, em São Bento do Sapucaí, falecia a mãe de Plínio, que,
estando já à beira da morte, tomou o livro do filho nas mãos, projetando lê-lo
mais tarde, quando estivesse melhor, o que infelizmente não ocorreu.
Considerado por Wilson Martins a maior realização
romanesca brasileira da década de 1920, ao lado de O esperado, também de Plínio Salgado,[15]
e classificado por Rachel de Queiroz como “o primeiro romance modernista”,[16]
O estrangeiro, que seria considerado
pelo autor o seu primeiro Manifesto Integralista,[17]
fez do futuro criador da Ação Integralista Brasileira um escritor nacionalmente
consagrado, tanto pelo público quanto pela crítica.
Dentre os diversos críticos literários e escritores
de renome que elogiaram O estrangeiro na
imprensa, nos meses seguintes à sua publicação, podemos citar Agripino Grieco,
Afrânio Peixoto, Tasso da Silveira, Augusto Frederico Schmidt, Cassiano Ricardo,
Nuto Sant’Anna, Jackson de Figueiredo, José Américo de Almeida, Rodrigues de
Abreu, Tristão de Athayde e Monteiro Lobato. Este último dedicou ao romance um
magnífico artigo intitulado Forças novas e
publicado no jornal A manhã, do Rio
de Janeiro, aos 19 de setembro de 1926.
No referido artigo, o autor de Cidades mortas e de O
presidente negro, havendo reconhecido que “Plínio Salgado consegue o
milagre de abarcar todo o fenômeno paulista, o mais complexo do Brasil, talvez
um dos mais complexos do mundo, metendo-o num quadro panorâmico de pintor
impressionista”, frisou que “todo o livro é uma inaudita riqueza de novidades
bárbaras, sem metro, sem verniz, sem lixa acadêmica – só força, a força pura,
ainda não enfiada em fios de cobre, das grandes cataratas brutas”. E terminou o
escritor patrício o seu artigo sobre O
estrangeiro dizendo que “Plínio Salgado é uma força nova com a qual o país
tem que contar”.[18]
Como já mais de uma vez observamos,[19]
em O estrangeiro e nos dois romances
sociais em prosa modernista que se lhe seguiram e que com ele compõem as
denominadas Crônicas da vida brasileira
(O esperado, de 1931, e O cavaleiro de Itararé, de 1933), Plínio
Salgado se revelou o genial cronista, intérprete de uma época de dúvidas e de
incertezas que, sob o signo dos mais sadios e edificadores ideais cristãos,
patrióticos e nacionalistas e absolutamente livre das questões da forma e do
estilo, demonstrou ser arguto espectador e profundo conhecedor de todas as
correntes de opinião e de todos os dramas dos diferentes segmentos da Sociedade
Brasileira de seu tempo. Revelou-se, ademais, dotado de formidável capacidade
de compreender todos os antagonismos, assim como de alma para efetivamente
sentir, sofrer e expressar, sem temor ao uso da palavra, todos os complexos
estados de espírito nacionais. Nenhuma frase pode, com efeito, defini-lo melhor
do que aquela em que assim afirmou, no início de sua obra Despertemos a Nação: “O drama de meu povo apoderou-se de mim”.[20]
Conforme salientou Francisco Elías de Tejada, a
“vocação de escritor egrégio” impeliu Plínio Salgado “à literatura, mas uma
literatura a serviço dos ideais de um Brasil autêntico”, tendo sido o romance O estrangeiro não apenas “uma das
cumiadas da literatura brasileira”, mas também “a necessária análise sociológica”
da qual nasceria “um pensamento robustíssimo, o mais brasileiro que dar-se
possa”.[21]
Ainda como notou o autor de As doutrinas
políticas de Farias Brito (1953), Jackson de Figueiredo apreendeu, com sua
característica agudeza, o significado de O
estrangeiro, que “acima dos seus maravilhosos méritos literários, e além do
finíssimo estudo sociológico”, vem a ser “todo um programa político”,[22]
constituindo-se, nas palavras do próprio Jackson de Figueiredo, em “um livro de
esperança e de fé” na grande Pátria Brasileira.[23]
Os anos seguintes
à publicação de O estrangeiro foram
fecundos na vida de Plínio Salgado, que colaborava em diferentes jornais e
revistas e foi figura central dos grupos modernistas verde-amarelista e da
Anta, bem como de diversos outros grupos, na meditação sobre a realidade e os
problemas sociais e nacionais. Assim, dedicou-se, com Alarico Silveira e Raul
Bopp, ao estudo da língua tupi e da etnografia nacional, ao mesmo tempo em que,
ao lado de Cândido Motta Filho, Fernando Callage, Plínio Mello e outros,
estudava Alberto Torres, Euclides da Cunha, Tavares Bastos, Oliveira Vianna,
Calógeras, Oliveira Lima e outros autores que estudaram nossa Terra e nosso
Homem. Ao mesmo tempo, com Augusto Frederico Schmidt e outros, dedicou-se ao
estudo da obra de Jackson de Figueiredo e de outros pensadores católicos e
espiritualistas. E, por fim, com Mário Pedrosa, Araújo Lima, Plínio Mello e
outros, estudou o marxismo, lendo a obra de Marx, Lênin, Trótski, Plekhanov,
Riazanov e outros pensadores socialistas e considerando válidas suas críticas
ao capitalismo, mas não as supostas soluções por eles apresentadas.
No ano de 1928, foi
Plínio Salgado eleito Deputado Estadual pelo Partido Republicano Paulista
(PRP), entrando pelo 2º turno e sendo o candidato mais votado. Foi sufragado
não apenas por seu partido, mas pela totalidade das forças eleitorais do 3º
Distrito, incluindo o Partido Democrático, de oposição, o Partido Independente,
de Gama Rodrigues, e dissidências locais que se coligaram para elegê-lo,[24]
cumprindo ressaltar que toda sua atuação no PRP obedeceu ao firme propósito de
criar uma corrente renovadora dentro daquele partido.
Em julho de 1929, o
autor de O estrangeiro (1926) e de Literatura e política (1927) tomou posse
na Academia Paulista de Letras, ocupando a cadeira de número seis, cujo patrono
é Couto de Magalhães, a quem muito admirava, e para a qual fora eleito à
revelia, como então se usava naquela instituição.
Isto posto, cumpre
salientar que Plínio Salgado jamais se candidatou a membro de qualquer Academia
de Letras, somente havendo ingressado na Paulista por ter sido eleito à
revelia, mas pertenceu a diversas instituições científicas e culturais,
incluindo o Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, que, aliás, prestou
uma belíssima homenagem ao escritor e pensador sambentista por ocasião do
centenário de seu nascimento, em 1995.
Em 1930, Plínio
Salgado viajou para o velho mundo, acompanhando o jovem Joaquim Carlos Egydio
de Souza Aranha, percorrendo catorze países do Oriente Médio e da Europa. Na
Palestina, conheceu os lugares que tão bem haveria de descrever em sua Vida de Jesus, obra que atingiria várias
edições em diferentes países e idiomas e receberia entusiásticos elogios de
notáveis pensadores, escritores, críticos e autoridades religiosas do Brasil e
da Europa. Em Roma, encontrou-se, dentre outros, com Benito Mussolini e com o
Senador Giovanni Gentile, filósofo e ex-Ministro da Instrução Pública, e este,
que coordenava os trabalhos da Enciclopédia Italiana, pediu a Plínio que completasse
o verbete dedicado ao Brasil, o que ele fez em uma madrugada, com o auxílio de
Mário Graciotti, Manoel Gomes e Joaquim Carlos Egydio de Souza Aranha. E em
Paris, concluiu o romance O esperado,
publicado no ano seguinte, e redigiu um manifesto que meses mais tarde se
tornaria o Manifesto da Legião
Revolucionária de São Paulo.
Em julho de 1931, foi lançado, em São Paulo, o
primeiro exemplar do jornal nacionalista A
Razão, que tinha Alfredo Egydio de Souza Aranha como proprietário e Plínio
Salgado como principal redator e revolucionou a imprensa do País, tendo como
colaboradores intelectuais da estirpe de Tristão de Athayde, Sobral Pinto, San
Tiago Dantas, Mário Graciotti, Paulo Setúbal, João Carlos Fairbanks, Alpínolo
Lopes Casali, Silveira Peixoto, Nuto e Leopoldo Sant’Anna e, é claro, Plínio
Salgado. Este era autor do artigo diário de abertura daquele matutino, a
célebre Nota Política, em que era
analisada a situação do País, pondo-se em evidência pensadores até então
relativamente olvidados, como Farias Brito, Alberto Torres, Euclides da Cunha,
Oliveira Lima, Joaquim Nabuco e Tavares Bastos e Eduardo Prado e rememorando-se
fatos do Império e da República.
Foi na Nota
Política, transcrita no jornal Era
Nova, da Bahia, e em jornais do Ceará, bem como, por iniciativa de Antônio
Felício dos Santos, no jornal católico A
União, do Rio de Janeiro, que Plínio revelou, na expressão de Virgínio
Santa Rosa, o sociólogo que vivia embuçado no romancista, sendo saudado por
Tristão de Athayde como a maior revelação do ano.[25]
Também em 1931, foi
lançado o Manifesto da Legião
Revolucionária, elogiado por intelectuais do quilate de Oliveira Vianna,
Tristão de Athayde, Azevedo Amaral, Octavio de Faria e Humberto de Campos,
dentre outros, e que já é, pelo seu conteúdo, um autêntico manifesto
integralista.
Em 12 de março do ano
seguinte, Plínio Salgado fundou oficialmente, na Sala de Armas do Clube
Português, em São Paulo, a Sociedade de Estudos Políticos (SEP), que reuniria
dezenas de intelectuais preocupados em dar um rumo ao Brasil, reconduzindo-o às
bases morais de sua formação.
A 07 de outubro daquele ano de 1932, divulgou
Plínio Salgado o Manifesto que redigira em maio e cujo anteprojeto fora
aprovado pela assembleia da SEP em junho, não havendo sido divulgado então por
conta da Revolução Constitucionalista ora já iminente.
O Manifesto
de Outubro, que assim passou a ser denominado em virtude de haver sido
divulgado em tal mês, marcou o surgimento oficial do Integralismo e da Ação
Integralista Brasileira.
Inspirado, antes e acima de tudo, nos ensinamentos
perenes do Evangelho, na Doutrina Social da Igreja e nas lições de grandes
pensadores espiritualistas, patrióticos e nacionalistas patrícios, o Manifesto de Outubro, em suas páginas
transbordantes de Fé e de Brasilidade, já
trata, ainda que resumidamente, de todos os princípios básicos da Doutrina
Integralista, posteriormente aprofundados em outros manifestos, assim como em
livros, artigos e discursos de Plínio Salgado e de outros doutrinadores
integralistas. Dentre tais princípios, podemos enumerar os seguintes: Afirmação
da existência de Deus e da Alma Imortal do Homem; Concepção Integral do
Universo e do Ente Humano; Patriotismo; Nacionalismo Integral, justo,
equilibrado, sadio e edificador, alicerçado na Tradição e tendente ao autêntico
Universalismo, que não pode ser confundido com o internacionalismo liberal ou
comunista; defesa da Família, cellula
mater da Sociedade, e do Município, cellula
mater da Nação; respeito à Tradição Nacional; combate sem tréguas ao comunismo
e ao liberal-capitalismo internacional; guerra sem quartel ao cosmopolitismo;
sustentação da Harmonia e da Justiça Social; restauração dos princípios de
Autoridade, Hierarquia e Disciplina; luta sem tréguas contra o racismo e em
prol da valorização do nosso povo e das nossas tradições, bem como dos
pensadores e escritores nacionais; pugna pela construção de uma Democracia
Integral e de um Estado Ético Orgânico Integral Cristão, instrumento da Nação,
do Homem do Bem Comum.
A mensagem essencialmente cristã e brasileira do Manifesto de Outubro espalhou-se
rapidamente por todo o Brasil. Em pouco tempo, a Ação Integralista Brasileira
(AIB) já reunia centenas de milhares de membros e outros tantos simpatizantes
em todo o País, constituindo o primeiro “movimento de massas” e o primeiro
partido de âmbito nacional desde o fim do Império, reunindo, ainda, diversos
intelectuais ilustres, “bandeirantes do espírito”, no dizer de Genésio Pereira
Filho,[26]
que constituíam, na expressão de Miguel Reale, “o que havia de mais fino na
intelectualidade da época”,[27]
formando, ainda, nas palavras de Gerardo Mello Mourão, o “mais fascinante grupo
da inteligência do País”.[28]
Neste mesmo diapasão, o insuspeito Roberto Campos,
ao falar, em suas memórias, de San Tiago Dantas, evocou
“o surpreendente fascínio que o Integralismo exerceu em sua geração,
particularmente sobre a parte mais intelectualizada”,[29]
e o igualmente insuspeito Pedro Calmon, na biografia de seu pai, Miguel Calmon,
afirmou que a plêiade de intelectuais reunida pelo Integralismo “poderia lotar
uma Academia, em vez de ocupar uma trincheira”.[30]
Aliás, devemos dizer que Pedro Calmon se equivocou, pois a plêiade de
intelectuais que a Doutrina do Sigma reuniu, na década de 1930, em torno da
bandeira azul e branca, e que bem podemos denominar a falange dos “homens de
mil” do Integralismo, daria para lotar não apenas uma, mas várias academias.
No mesmo sentido, salientou Acacio Vaz de Lima
Filho que o Integralismo reuniu, na década de 1930, “o que havia de mais belo na
juventude brasileira em termos de ideal”, bem como “a fina flor da
intelectualidade nacional”, intelectualidade esta que, rompendo com a tradição
de servil imitação dos modelos estrangeiros, voltou-se “para o Brasil, e para as
mais profundas raízes da brasilidade”.[31]
Não nos propusemos, no presente artigo, a analisar
o Integralismo, tão augusta quanto deturpada Doutrina que se constituiu na
glória e na cruz de Plínio Salgado, “pensador
ilustre que arrebatava multidões na mocidade e serenava a ânsia dos
intelectuais com o ouro da sua pena”, na expressão de Manoel Vítor, e cuja
“rota pelo sigma”, ainda nas palavras deste, “nada mais era que a projeção da
sua mesma personalidade em busca de Deus para dá-lo aos homens”, sendo “a Família
e a Pátria” os “degraus por onde andou semeando rosas que lhe trouxeram o
paradoxal perfume dos espinhos”.[32]
Não podemos deixar de assinalar, contudo, que o Integralismo realizou, como
escreveu o próprio Plínio Salgado, “a maior obra cívica do Brasil”,[33]
tendo mobilizado desde “o homem do sertão até os numerosos e legítimos
expoentes da cultura nacional”[34]
e havendo soprado “a brasa do patriotismo aparentemente adormecido do povo
brasileiro, acendendo um clarão como de outro não há notícia na nossa Pátria”.[35]
Ainda como enfatizou o autor de Palavra
nova dos tempos novos (1936) e Espírito
da burguesia (1951), o Integralismo
Ensinou o povo a cantar o
Hino Nacional (que raríssimas pessoas sabiam); levou multidões a aplaudir
freneticamente os desfiles do Exército e da Marinha (que então, como hoje,
passavam nas ocasiões das paradas, em meio ao silêncio de reduzidos
espectadores frios e apenas curiosos); promoveu o culto das datas históricas e
dos heróis do nosso Passado Nacional, realizando comemorações imponentes, como
as de Caxias, de Carlos Gomes, de Tamandaré, de Couto de Magalhães, de Pedro
II, que foram memoráveis; abriu cerca de 3.000 escolas de alfabetização para
adultos e cerca de mil lactários para a infância; organizou bibliotecas e fez
dar cursos de História do Brasil, Geografia, Instrução Moral e Cívica, Economia
Política, elementos de Direito Público e de Filosofia; fundou milhares de
ambulatórios médicos e cooperou na obra de recuperação física da nossa gente;
realizou exposições e concertos e cursos de Cultura Artística, um dos quais foi
notabilíssimo, no salão da Escola Nacional de Belas Artes; e – o que mais
importava! – arregimentou a infância e a adolescência, incutindo-lhes
entusiasmo pelos nobres ideais, formando-lhes os corações segundo a doutrina do
Evangelho, incendiando-as num surto de patriotismo como nem antes nem depois se
viu algo de semelhante.[36]
O
Integralismo, ainda nas palavras do autor de O Integralismo na vida brasileira,
fez escola de austeridade e
de firmeza de princípios, de altruísmo e abnegação, de idealismo construtor, de
amor ardente pela Pátria, de sacrifício por ela. Uma escola de disciplina e de
ordem, de simplicidade e de modéstia, de preocupação pela coisa pública, de
apostolado pela regeneração dos costumes. Uma escola que tinha por base a
revolução interior, a transformação do próprio Homem pelo domínio de si mesmo,
na luta contra os baixos instintos que perseguem o Ser Humano como consequência
da culpa original. Uma escola de vigilância constante na defesa das bases fundamentais
da vida brasileira: a Religião, a Pátria, a Família.[37]
Antes de concluir nossas breves palavras sobre a
doutrina política de Plínio Salgado e a sua difusão em nosso País, reputamos
oportuno enfatizar que, como ressaltou D. Odilão Moura, nas páginas da obra Ideias católicas no Brasil,
“nacionalista, tradicionalista (...), o integralismo”, cujas teses não
contrariam a Doutrina Católica, propugna “por um Estado de estrutura
corporativa e municipalista (...), visando a um regime de justiça social para o
povo” e foi, assim como ainda é, um movimento, antes de tudo, educativo, que,
na década de 1930, conseguiu
dar a “grande parte da juventude brasileira (...) um ideal elevado, despertou
uma grande preocupação pelos problemas e tradições brasileiros, indicou uma
direção política visando mais às ideias que à eleição dos candidatos, desviou
do comunismo aqueles que desejavam uma ação política de reivindicações
sociais”.[38]
Ainda conforme frisou Dom Odilão Moura, o
Integralismo, cujos adeptos sacrificavam os interesses particulares em prol da
“redenção do Brasil”, onde deveria surgir “uma nova civilização cristã e
ordeira”, atraiu centenas de milhares de católicos por sua “posição
espiritualista”, pela valorização que sempre deu “às nossas tradições cristãs”,
pela aceitação dos princípios da Doutrina Social da Igreja e “pelo combate
tenaz ao comunismo”, e era, no Brasil dos anos 30 do século passado, no
entender do ilustre religioso beneditino e pensador tomista, “o único movimento
político não comunista que apresentava um programa de uma reforma social mais
ampla e fundamentada em ideias”, donde grande parte da mocidade nele haver
encontrado a “concretização de um ideal construtivo”. Assim, inúmeros “bispos,
sacerdotes, instituições religiosas, intelectuais e universitários católicos”
apoiaram o Integralismo ou mesmo “ingressaram nas suas fileiras” e graças, em
larga medida, a eles, o Movimento do Sigma – sem dúvida alguma o movimento
cívico-político que mais apoio recebeu, em todo o Mundo, de autoridades da Igreja
e de vultos do laicato católico – “cresceu enormemente, sendo raro o recanto
brasileiro onde não houvesse uma sede da AIB, propagando as ideias do
movimento, alfabetizando, prestando assistência social”.[39]
Consoante escreveu D. Odilão Moura, o gigantesco
crescimento que teve o Integralismo, em curto espaço de tempo, deveu-se, antes
e acima de tudo, à pena e aos discursos de Plínio Salgado, “homem inteligente,
autodidata, bom escritor e jornalista” e brilhante orador, que “sabia (...)
usar dos recursos oratórios como ninguém”.[40]
Tratando do Integralismo, observou o magistrado,
jurisconsulto e ensaísta Fernando Whitaker da Cunha que a Doutrina Integralista
merece ser estudada “pela seriedade de suas premissas e de seus propósitos”;
pelo fato de ter engendrado “o primeiro movimento partidário de repercussões
nacionais” desde a implantação da República; por pretender “um Direito Público
em moldes brasileiros”; por “censurar vaidades estadualistas em benefício da
pátria global e, acima de tudo, por pregar um Estado Ético fundado na moral
cristã, na dignidade do homem e no culto de Deus, da Nação e da Família”.[41]
Encerrando nossas breves linhas sobre a Doutrina do
Sigma, salientamos que, a exemplo do Padre Júlio Maria, reputamos que “o Integralismo em sua doutrina, sua
finalidade e em sua organização, é bom e merece o apoio de todos que têm amor a
sua Pátria e ao Progresso".[42]
Exilado involuntariamente em Portugal pelo Estado
Novo de Getúlio Vargas, que decretara o fechamento da Ação Integralista
Brasileira em 1937, Plínio Salgado lá permaneceu, juntamente com D. Carmela
Patti Salgado, com quem se casara em segundas núpcias, de 1939 até 1946.
Em Portugal, Pátria de que nasceu sua Pátria, o
autor de Reconstrução do Homem estudou
profundamente o pensamento tradicionalista português e espanhol, proferiu
algumas de suas mais belas conferências, escreveu as suas mais pujantes obras
religiosas e foi reconhecido pela intelectualidade católica como um dos maiores
pensadores católicos de todos os tempos e um verdadeiro apóstolo brasileiro.[43]
Foi em Portugal, ademais, que Plínio terminou sua
obra prima, a Vida de Jesus, que o
Padre Leonel Franca qualificou de “joia de uma literatura”[44]
e que é inegavelmente um clássico não apenas da Literatura Brasileira, mas da
própria Literatura Universal, assim como uma das obras máximas da Cristologia.
Como salientou o escritor português José Sebastião da Silva Dias, a Vida de Jesus, que “no gênero é o melhor
que até hoje se publicou em língua portuguesa”, tendo realmente “conseguido ser
‘a joia de uma literatura’”, teria “o mundo inteiro por mercado”, caso tivesse
sido “escrita em qualquer das grandes línguas europeias”.[45]
A respeito da obra prima de Plínio Salgado, assim
se exprimiu Dom Manuel Gonçalves Cerejeira, Cardeal Patriarca de Lisboa:
Falando
da Vida de Jesus, queria confessar
que é a mais bela de quantas tenho lido. Tão difícil de escrever, a Vida de Jesus de Plínio Salgado é, de
fato, a Vida de Jesus, feita com a
inteligência, com a alma e com o coração todo.[46]
Por suas obras religiosas, a exemplo da Vida de Jesus, “coroa luminosa de um
grande e silencioso drama”, no dizer do Cardeal Cerejeira,[47]
assim como de A aliança do sim e do não,
de Primeiro, Cristo!, de O Rei dos reis, de A Tua Cruz, Senhor, de Mensagens ao Mundo Lusíada, de A imagem daquela noite e de São Judas Tadeu e São Simão Cananita,
podemos considerar Plínio Salgado um dos maiores e mais profundos escritores
cristãos de todos os tempos e uma das máximas glórias do pensamento e das
letras cristãs do Mundo Lusíada.
Isto posto, cumpre salientar, que, como
escreveu o sacerdote jesuíta e jornalista italiano Domenico Mondrone, no
prefácio à edição italiana da Vida de
Jesus, transcrito na revista romana La
Civiltà Cattolica, não apenas as obras religiosas de Plínio Salgado, mas
todos os livros deste “escritor robusto e fecundo” são testemunhos “do ideal
cristão, ao qual está dirigida toda a sua vida de indivíduo e de cidadão e no
qual se enquadra a sua visão do mundo”.[48] E faz-se mister sublinhar, do mesmo
modo, que toda a vida de Plínio Salgado, desde seu retorno à Igreja, foi dedicada
à luta por Cristo. Com efeito, consoante frisou o egrégio historiador e
pensador tradicionalista português João Ameal, em palavras que fazemos nossas:
Plínio Salgado escreve,
fala, apostoliza sob a luz perene da obediência a Cristo; os argumentos que
emprega, são colhidos nas divinas palavras; as imagens que levanta, são
sugeridas pelas divinas lições, os apelos que lança, são o eco dos divinos
apelos e todo o seu programa é reimplantar na consciência dos contemporâneos a
figura excelsa do Filho de Deus e incitá-los a que O tomem por modelo e saibam
voltar ao integral cumprimento da Sua Lei.[49]
Durante os tempos de exílio em Portugal, Plínio
Salgado conheceu pessoalmente o Presidente do Conselho de Ministros daquele
País, Dr. António de Oliveira Salazar, a quem considerava, com razão, um dos
maiores estadistas de seu tempo e da História Lusíada. Unidos por profundos laços
doutrinários e por um entranhado sentimento de mútua admiração, o estadista
português e o escritor, pensador e líder político brasileiro se encontraram
algumas vezes, durante e após o exílio de Plínio em terras portuguesas,[50]
e trocaram diversas cartas ao longo dos anos.
De volta ao Brasil em 1946, Plínio Salgado
ingressou no Partido de Representação Popular (PRP), que havia sido fundado no
ano anterior por ex-membros da Ação Integralista Brasileira e que pugnava pelos
mesmos ideais cristãos e brasileiros pelos quais esta havia pugnado. Por este
partido foi candidato às eleições presidenciais de 1955 e se elegeu Deputado Federal
em 1956, 1960 e 1964. Exerceu outros dois mandatos na Câmara, eleito pela
Aliança Renovadora Nacional (ARENA), até deixar definitivamente a política, em
1974. Faleceu um ano depois, no Hospital Sírio-Libanês, na Cidade de São Paulo,
tendo sido sepultado no Cemitério do Morumbi.
Como Deputado Federal, integrou sempre a Comissão
de Educação, na qual produziu inúmeros pareceres, e apresentou projetos como os
de Reforma Agrária e de criação do Fundo Nacional para a Reforma Agrária, ambos
de 1963, e o da Emenda Constitucional n. 609, que criaria a Câmara Orgânica,
consagrando o princípio organicamente democrático da representação política dos
trabalhadores de acordo com suas categorias profissionais.
Plínio Salgado, “esse injustiçado”, nas palavras de
Pedro Paulo Filho, deixou à Pátria, ao morrer, “exemplo inolvidável de um dos
maiores pensadores políticos brasileiros e uma herança cultural soberba”, que o
elenca “entre os mais notáveis escritores do Brasil”.[51]
Como bem salientou Francisco Elías de Tejada, “com todos os defeitos que toda
obra humana possui, e Plínio era um ser humano, a sua obra aparece majestática”
pelo muito “que tem de coerente, pela lógica interna que anima o seu sistema”
e, sobretudo, “pela magnitude do pensamento que sabe elaborar uma teoria da
Tradição brasileira com traços de granítico castelo, destinado a suscitar
adesões para quem queira em tempos vindouros conhecer a substância do Brasil”.[52]
Como evocamos na “orelha” da obra “Existe um pensamento político brasileiro?”
Existe, sim, Raymundo Faoro: o Integralismo!, organizada por Gumercindo
Rocha Dorea, ao saudar Plínio Salgado, por ocasião de uma conferência que este
realizou na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, em 3 de agosto de
1953, o Professor Heraldo Barbuy, egrégio filósofo, sociólogo e escritor
paulista, examinando a obra de Plínio Salgado como escritor, pensador e homem
de ação, observou que a Doutrina Pliniana se tornara, então, mais do que nunca,
necessária por firmar os verdadeiros conceitos do Homem, da Sociedade e do
Estado, e terminou seu discurso exaltando a tenacidade, a coerência e a
capacidade de sacrifício de Plínio Salgado, sustentando seu nobre e límpido
pensamento em meio às injustiças e incompreensões.[53]
Ainda como escrevemos na “orelha” do aludido livro,
na hora presente, ainda muito mais do que no ano de 1953, é necessária a
Doutrina Pliniana para o nosso Brasil e para todo o Mundo e a leitura do Manifesto de Outubro confirmará isto a
todas as pessoas intelectualmente honestas que a fizerem.
Seja esta nossa singela homenagem a esse grande
arauto e apóstolo da Fé e da Brasilidade e condestável do Brasil Integral que
foi e é Plínio Salgado, neste centésimo vigésimo segundo aniversário de seu
nascimento. Como escrevemos algures,[54]
os já muitos anos de calúnias, de incompreensões e de silencio não foram
capazes de apagar o brilho do autor da Vida
de Jesus (1942) e de O Rei dos reis (1946),
que fulgirá sempre, magna estrela da constelação do pensamento pátrio, luzente
joia da rica coroa que representa a autêntica inteligência nacional, farol
magnífico a guiar a nau dos verdadeiros tradicionalistas, patriotas e
nacionalistas brasileiros pelos tenebrosos mares do Império de Calibã, que é o
Império da Matéria, rumo ao porto seguro do Império de Ariel, que não é outro
senão o Império do Espírito.
Mais genial, pujante e vigoroso intérprete da
Tradição Nacional e do Espírito do Povo brasileiro, esse assinalado bandeirante
da Fé e do Império e guerreiro de Deus e da Pátria, viverá, imortal, em sua
obra notabilíssima e sempre atual, em que defende a restauração do Primado do
Espírito e da Tradição, a recristianização integral do Brasil e a instauração
de um Estado Ético e de uma Democracia Integral, assim como viverá sua alma
igualmente imortal, junto do Cristo que tanto amou. Em uma palavra, o nome de
Plínio Salgado perpetuar-se-á, conforme previu Juscelino Kubitschek, “como um
símbolo iluminando o futuro”[55]
deste vasto Império da Terra de Santa Cruz-Brasil.
Por Cristo e pela Nação!
Victor Emanuel Vilela Barbuy,
Presidente Nacional da Frente Integralista
Brasileira e 1º Vice-Presidente da Casa de Plínio Salgado.
São Paulo, 22 de janeiro de 2017-LXXXIV.
*O presente artigo se constitui numa versão
revista, ampliada e atualizada da palestra que demos no Instituto Histórico e
Geográfico de São Paulo no último dia 11 de novembro, por ocasião do lançamento
do livro “Existe um pensamento político brasileiro?” Existe, sim, Raymundo
Faoro: o Integralismo!, organizado por Gumercindo Rocha Dorea.
[1] A notável oração do Dr. Hipólito Raposo, in VV.AA., Plínio Salgado: “in memoriam”, vol. II. São Paulo, Voz do
Oeste/Casa de Plínio Salgado, 1986, p. 189.
[2] Plínio
Salgado na tradição do Brasil, in VV.AA., Plínio Salgado: “in memoriam”, vol. II, cit., p. 47.
[3] Idem, p. 70.
[4] O
cavaleiro do Brasil Integral, in Sei
que vou por aqui!, ano I, n. 2, São Paulo, setembro-dezembro de 2004, p.
XVII. Artigo originalmente publicado no Jornal
do Brasil a 20/07/1933.
[5] Plínio
Salgado na tradição do Brasil, in VV.AA, Plínio Salgado: “in memoriam”, vol. II, p. 48.
[6] Cf. Juscelino KUBITSCHEK, Carta a Plínio
Salgado, in VV.AA., Plínio Salgado: “In
memoriam”, vol. I., São Paulo,
Voz do Oeste/Casa de Plínio Salgado, 1985, p. 223.
[7] O
Direito em Plínio Salgado, in Gumercindo Rocha DOREA (Organizador e
introdutor), Anais do centenário e da 2ª
Semana Plínio Salgado, São Paulo, Edições GRD; São Bento do Sapucaí, São
Paulo, Espaço Cultural Plínio Salgado, 1996, p. 97. Trabalho escrito para as
comemorações do centenário de nascimento de Plínio Salgado, em 1995, e que foi
tema da palestra proferida pelo autor a 08 de outubro daquele ano, em São Bento
do Sapucaí, por ocasião da 2ª Semana Cultural Plínio Salgado.
[8] Idem, p. 98.
[9] Plínio
Salgado (biografia), 5ª ed., São Paulo, De Cápua, 2000, p. 5.
[10] Recuperando
literariamente Plínio Salgado, in Boletim da Academia de Letras de Campos do
Jordão, ano XIV, nº 69, setembro de 1999, p. 3.
[11] Plínio
Salgado na tradição do Brasil, in VV.AA., Plínio Salgado: “in memoriam”, vol. II, cit., pp. 52-53.
[12] Plínio
Salgado, o fraterno amigo, in VV.AA., Plínio
Salgado: “in memoriam”, vol. I., cit., p. 45.
[13] Cf. RODRIGUES, Rodrigo, O Pensamento Nacionalista no Modernismo
Brasileiro, São Paulo, EditorAção, 2005, p. 35.
[14] Bem nos lembramos de que, durante a
conversa que tivemos, no ano de 2005, com o Professor Miguel Reale, concordou
este conosco quando dissemos que O
estrangeiro é o maior poema em prosa do Modernismo Brasileiro e ressaltou,
em seguida, que não apreciava muito os poemas em verso de Plínio Salgado, mas
gostava bastante de seus poemas em prosa, como os romances O estrangeiro, O esperado,
O cavaleiro de Itararé e A voz do Oeste, assim como a Vida de Jesus.
[15] O
modernismo, 4ª edição, São Paulo, Editora Cultrix, 1973, p. 251. Cumpre
ressaltar que Wilson Martins cometeu um pequeno equívoco ao considerar o
romance O esperado, escrito quase que
integralmente em 1930 e publicado no ano seguinte, como uma obra da década de
1920.
[16] In A
Hebraica, São Paulo, julho de 1995, p. 33.
[17] Despertemos
a Nação, 3ª edição, in Obras Completas.
2ª ed., vol. X, São Paulo: Editora das Américas, 1957, p. 9.
[18] Forças
novas, in VV.AA., Plínio Salgado: “in
memoriam”, vol. I, cit., pp. 112-113.
[19] Oitenta
anos de “O estrangeiro”, in Linguagem
Viva, ano XVIII, nº 214, junho de
2007, p. 4. Também disponível em: http://www.linguagemviva.com.br/214.pdf. Acesso em 22 de
janeiro de 2017; Plínio Salgado, arauto e
apóstolo de Cristianismo de Brasilidade, in O Lince,
nova fase, ano 4, nº 31, Aparecida-SP, jan./fev. de 2010, p. 17. Também
disponível em:
http://www.jornalolince.com.br/2010/fev/pages/focus-plinio-salgado.php. Acesso
em 22 de janeiro de 2017; 90 anos de O
estrangeiro, in O Lince, nova fase, ano 10, nº 72, Aparecida-SP,
nov./dez. de 2016, pp. 23-35. Também disponível em: http://www.integralismo.org.br/?cont=781&ox=396#.WISY7fkrLIU.
Acesso em 22 de janeiro de 2017.
[20] Despertemos
a Nação, cit., loc. cit.
[21] Plínio
Salgado na tradição do Brasil, in VV.AA., Plínio Salgado: “in memoriam”, vol. II, cit., p. 50.
[22] Idem, p. 51.
[23] O
saci, o Avanhandava e o imperialismo
pacífico, in VV.AA., Plínio Salgado:
“in memoriam”, vol. I, cit., p. 100. Artigo originalmente publicado na Gazeta de Notícias, do Rio de Janeiro, a
1 de dezembro de 1926.
[24] Cf.,Maria Amélia Salgado LOUREIRO, Plínio Salgado, meu pai, cit., p. 154.
[25] A
personalidade de Plínio Salgado, in VV.AA., Plínio Salgado, 4ª
edição, São Paulo, Edição da Revista Panorama, 1937, p. 73.
[26] Palavras
iniciais, in Plínio SALGADO, Extremismo
e Democracia, 1ª edição, São Paulo, Editorial Guanumby, s/d, p. 8.
[27] Entrevista concedida ao Jornal da USP. Disponível em: http://espacoculturalmiguelreale.blogspot.com/2007/08/entrevista-concedida-pelo-prof-reale-ao.html. Acesso em 22 de janeiro de 2017.
[28] Entrevista concedida ao Diário do Nordeste. Disponível em:
http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=414001.
Acesso em 22 de janeiro de 2017.
[30] Miguel
Calmon – uma grande vida, Prefácio de
Afonso Arinos de Melo Franco, Rio de Janeiro, José Olympio Editora; Brasília,
INL, 1983, p. 170.
[31] Prefácio,
in Gumercindo Rocha DOREA (Organizador), “Existe
um pensamento político brasileiro?” Existe, sim, Raymundo Faoro: o
Integralismo!: uma nova geração analisa e interpreta o Manifesto de Outubro de
1932 de Plínio Salgado, cit., p. XVI.
[32] Plínio
Salgado, pensador ilustre, in VV.AA., Plínio
Salgado: “In memoriam”, vol. I., cit., pp. 41-42.
[33] O
Integralismo na vida brasileira, in Enciclopédia do Integralismo,
vol. I, Rio de Janeiro, Edições GRD/Livraria Clássica Brasileira, s/d (1958),
p. 37.
[34] Idem, p. 7.
[35] Idem, p. 37.
[36] Idem, pp. 37-38.
[37] Idem, p. 38.
[38] Idéias
católicas no Brasil, São Paulo, Convívio, 1978, pp. 99-100.
[39] Idem, p. 98.
[40] Idem, p. 99.
[41]
Democracia e Cultura (a Teoria do Estado
e os pressupostos da ação política), 2ª edição revista e aumentada, Prefácio
de Artur Machado Paupério, Rio de Janeiro, Forense, 1973, p. 268.
[43] Sobre as atividades realizadas por Plínio
Salgado durante o exílio em Portugal, bem como sobre o reconhecimento que ali
recebeu dos mais altos vultos do pensamento católico lusitano: Augusta Garcia
R. DOREA, Plínio Salgado, um apóstolo
brasileiro em terras de Portugal e Espanha, São Paulo, Edições GRD, 1999.
[44] Carta a Plínio Salgado, Plínio
SALGADO, Vida de Jesus, 22ª edição, São Paulo, Voz do Oeste, 1985, pp.
IX/XI.
[45] Vida
de Jesus, de Plínio Salgado, in in VV.AA., Plínio Salgado: “in memoriam”, vol. II, cit., pp. 146-147.
[46] In Plínio SALGADO, Vida de Jesus, 9ª edição, in Obras
completas, volume I, 2ª edição, São Paulo, Editora das Américas, 1956, p.
9.
[47] A
Igreja e o pensamento contemporâneo, 4ª
edição (com algumas notas inéditas), Coimbra, Coimbra Editora, 1944, p. 385.
[48] Plínio
Salgado: o homem, a atividade, a obra-prima, in in VV.AA., Plínio Salgado: “in memoriam”, vol. II. São
Paulo, Voz do Oeste/Casa de Plínio Salgado, 1986, p. 159.
[49] Plínio Salgado ou a nova luta por Cristo,
in VV.AA., Plínio Salgado: “in memoriam",
vol. II, São Paulo, Voz do Oeste/Casa de Plínio Salgado, 1986, p. 129.
[50]
Os jornais Diário de Lisboa, da
Capital Portuguesa, e A Marcha, do
Rio de Janeiro, o primeiro do dia 15 de maio de 1962 e o segundo de dois dias
mais tarde, noticiaram aquele que foi, provavelmente, o último encontro entre
Salazar e Plínio Salgado, ocorrido na manhã daquele 15 de maio.
[51] Plínio
Salgado, esse injustiçado, in
Gumercindo Rocha DOREA (Organizador e apresentador), São Bento do Sapucaí, São
Paulo, Espaço Cultural Plínio Salgado, 1994, p. 25. Texto da palestra proferida
por Pedro Paulo Filho em São Bento do Sapucaí a 07 de outubro de 1993, por
ocasião da 1ª Semana Plínio Salgado.
[52] Plínio
Salgado na tradição do Brasil, in VV.AA., Plínio Salgado: “in memoriam”, vol. II, cit., p. 53.
[53][53] Cf. A MARCHA, Plínio Salgado falou aos estudantes da Universidade Católica de São
Paulo, in A Marcha, ano I, n. 26, 14 de
agosto de 1953, p. 1.
[54] Plínio Salgado, arauto e apóstolo de Cristianismo de
Brasilidade, cit., p. 18. Também
disponível em:
http://www.jornalolince.com.br/2010/fev/pages/focus-plinio-salgado.php. Acesso
em 22 de janeiro de 2015.
[55] Carta a D. Carmela Patti Salgado, in
VV.AA., Plínio Salgado: “In memoriam”, vol. I.,
cit., p. 225.
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